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A começar pelo começo (da vida) – Parte 1/3

abril 15, 2024

Há anos sou atraída pelos livros da psicóloga e pesquisadora americana Elaine Aron, que cunhou o termo HSP – “Highly Sensitive Person” (Pessoa Altamente Sensível). O nome designa, em termos gerais, uma pessoa com um sistema nervoso sensível – de formas e em graus variados.

Em mim, essa característica é bastante evidente.

Em meus 41 anos de vida, muitos eventos, de consequências difíceis, poderiam ter me levado a ter um cuidado mais especial com meu sistema nervoso, melhorando, assim, minha qualidade de vida. Mas somente o nascimento de minha filha, há dois anos e meio, foi capaz de me colocar de frente com minha alta sensibilidade. E isso foi triplamente desafiador, porque, a partir daquele momento, eu teria que trocar dois pneus furados do meu carro enquanto o dirigia: era (e sempre será) necessário não apenas (1) reeducar minha mente-corpo para mim mesma, mas também (2) aprender a maternar como uma mãe altamente sensível enquanto (3) aprendia a cuidar de uma filha altamente sensível: como intuí desde muito cedo, minha filha tem essa característica.

Com isso, decidi que o ponto de partida desta pesquisa e do trabalho de comunicação sobre sensibilidade, em seus muitos – talvez infinitos – aspectos e possibilidades, seria o ponto em que minha filha, agora com dois anos de idade, começou sua vida neste mundo opressivo demais para pessoas como nós. É um começo que fala do cuidado para com ela, ou seja, para com as crianças. Este texto, parte 1 de 3, tende a ajudar mães, pais, cuidadores/as responsáveis, educadores/as… que estão se perguntando se sua criança tem essa característica ou que, suspeitando que ela seja muito sensível, precisam de conselhos sobre por onde começar seus cuidados com esse serzinho especial.

De cara, sugiro que você olhe para si mesmo/a: você tem essa característica? De acordo com o Dr. Aron, 20% da população mundial a tem. Essa auto investigação me parece indispensável para qualquer cuidador/a de crianças, pois a alta sensibilidade do/a cuidador/a pode ser um grande desafio (e também, se bem direcionada, uma grande aliada) nessa tarefa crucial. Se você sabe inglês, recomendo que vá diretamente à fonte, ou seja, ao site da Dra. Aron, onde ela oferece tanto o autoteste quanto o teste para crianças: aqui. Você pode encontrar o teste “Você é uma pessoa Altamente sensível?” traduzido para o português em vários outros sites (dá um gúgol!).

Neste início de jornada de cuidados com a minha sensibilidade especial e a de minha filha, além da dra. Aron, conto com outras autoras – assuntos muitos para outros textos – e com o apoio de algumas terapeutas. Uma delas, Gaby Trujillo, é terapeuta ocupacional – profissional que é um/a grande aliado/a do/a cuidador/a (altamente sensível ou não) da criança altamente sensível. Com a Gaby, pude começar a intervir de forma mais objetiva nas necessidades do sistema nervoso do minha filha, enquanto aprendo, gradualmente, sobre minhas próprias necessidades e formas de atendê-las.

A Gaby topou responder algumas perguntas básicas sobre o assunto e que podem te guiar num começo de exploração das suas circunstâncias, potencialmente, altamente sensíveis. 

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Pergunta: Como se pode descrever uma pessoa muito sensível?

Resposta: Com base na minha experiência, são pessoas que têm uma forma particular de processar a informação sensorial, muito mais profunda, pelo que tendem a perceber profundamente os acontecimentos, as sensações, a dor, as emoções, entre outros. Isso faz com que consigam integrar as diferentes variáveis de uma situação, pois o traço as torna muito mais empáticas – quando são capazes de processar e gerir as suas emoções. O traço está diretamente relacionado com o seu sistema nervoso.

P: As crianças muito sensíveis nascem assim ou se tornam?

R: O processamento sensorial é um aspecto fisiológico do ser humano, pelo que cada um de nós nasce com uma forma de processar a informação. O ambiente e o indivíduo se fundem para facilitar a regulação dessa criança, que nasce, cresce e se desenvolve em função dessas condições.

P: Como podemos detectar o traço de alta sensibilidade numa criança?

R: Observando-as. Numa sessão com uma criança altamente sensível, posso notar, por exemplo, que ela leva mais tempo para processar as respostas, seja por meio de gestos, comportamentos, atitudes… Observo como ela pensa enquanto isso. Há também alguns indicadores clínicos que observo em nível de pele, tônus muscular, temperamento, entre outros.

P: Que profissionais podem ajudar mães e pais a cuidarem dos seus filhos muito sensíveis, fornecendo-lhes orientações e ferramentas?

R: Terapeutas ocupacionais especializados em integração sensorial, psicólogos ou psiquiatras especializados em experiências somáticas.

P: Existe uma idade mínima ou máxima de intervenção para que os cuidados com uma criança altamente sensível sejam eficazes, de modo a proporcionar-lhe uma boa qualidade de vida?

R: Nos primeiros 6 anos de vida o nosso cérebro está sendo formado, pelo que todas as experiências que uma pessoa tem durante esses anos vão formar a base das suas estruturas cerebrais, padrões de comportamento, formas de reagir, de se regular, entre outros. Qualquer intervenção é sempre melhor quanto mais cedo for iniciada. De toda forma, o momento em que uma pessoa decide (se) consultar é o melhor momento.

P: É comum uma criança sensível ter pais com a caraterística de altamente sensíveis. Que conselhos você tem para esses pais em termos de autocuidado?

R: Que esses cuidadores leiam sobre Integração Sensorial, aprendam sobre a alta sensibilidade, porque a alta sensibilidade não tratada gera problemas de ansiedade quando as pessoas são adultas (isso é algo que já foi cientificamente comprovado). Por isso, se também tiverem filhos com hipersensibilidade, é difícil ensiná-los a lidar com ela também. Também é possível acompanhá-los com um especialista que possa ajudá-los nas suas necessidades enquanto desenvolvem recursos internos para se sustentarem.

Você pode seguir a Gaby nesse perfil do Instagram.